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Papel da endoscopia nas lesões subepiteliais do trato gastrointestinal

por Luciano Lenz
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No mês de junho de 2017 foi publicado na “Gastrointestinal Endoscopy” a nova diretriz das lesões subepiteliais (LSEs) no trato gastrointestinal.

Devido a frequência e ao potencial maligno destas lesões faremos aqui alguns comentários  sobre esse Guideline.

Antes de mais nada, o endoscopista deve estar familiarizado com os aspectos endoscópicos e ecoendoscópicos essas lesões.

 

Características das lesões subepiteliais:

 

Começaremos discutindo as características dos Tumores estromais (GISTs). Essas lesões têm formato esférico ou fusiforme sendo mais comuns no estômago (70%) e endurecidos à palpação com a pinça.

  • São da muscular própria. Essa e outras revisões colocam que podem ser da muscularis mucosa (mas faço uma ressalta aqui – desafio quem achar a referência original de um GIST da muscular da mucosa, PS não vale livro texto e revisão!!!)
  • Na Ecoendoscopia, são hipoecóicos e homogêneos.   Alguns aspectos podem sugerir malignidade: tamanho > 3 cm, heterogeneidade, cistos, úlceras e bordas irregulares.
  • Punção ecoguiada (FNA) pode ser realizada com obtenção de material para imunohistoquímica. Entretanto o índice mitótico não pode ser avaliado pelo material da punção (só da cirurgia).
  • Noventa e cinco por cento dos casos são positivos para CD117. Portanto em cerca de 5% o CD117 é negativo!! Para estes casos um novo marcador DOG1 (Discovered on GIST 1) é útil.
  • Todos os GISTs têm algum potencial maligno. Sendo os do delgado mais agressivos com até 50% de malignidade!!! Indicações de cirurgia: sintomas, adenopatia regional, > 2 cm e as de qualquer tamanho no delgado. Para lesões < 2 cm mas com aspectos de alto risco na eco sugere-se ressecção também. Para aqueles pequenos e sem aspectos de alto riso, recomenda-se nova ECO em 6 a 12 meses.

Lesão subepitelial de parede posterior de corpo gástrico

Lesão localizada na quarta camada

 

Leiomiomas são mais comuns no esôfago (especialmente terço distal). Na Eco são idênticos aos GISTs, sendo negativos para CD117 e positivos para desmina e actina. Cirurgia está somente indicada se sintomáticos.

 

Lipomas são mais comuns no antro e cólon. São amarelos e amolecidos (sinal do travesseiro). Hiperecóicos e da submucosa na ECO. Punção, vigilância e tratamento não são necessários.

Lesão subepitelial de bulbo duodenal

Lesão hiperecóica de submucosa sugestiva de lipoma

 

 

Tumores neuroendócrinos (carcinóides) são lesões polipóides podendo ter erosão apical, sendo hipoecóicos e da submucosa ou mucosa profunda. Os gástricos são divididos em três tipos

  • I – associados a anemia perniciosa e gastrite atrófica. Baixa malignidade
  • II – associada à Zollinger-Ellison. Risco intermediário de malignidade
  • III – Solitários. Alto risco de metástases.

EMR pode ser considerada para os tipos I e II que forem < 2 cm, com controle a cada 6-12 meses por três anos. As do Tipo III necessitam tratamento cirúrgico (exceção para as < 1 cm e bem diferenciadas que podem ser ressecadas por via endoscópica)

Os neuroendócrinos retais < 1 cm podem ser ressecados por via endoscópica sem a necessidade de EUS prévio e se as margens forem negativas nem vigilância é necessária. Para lesões intermediárias (entre 1- 2 cm) fazer EUS antes e se ausência de adenopatia e infiltração profunda, a ressecção endoscópica pode ser realizada. E posterior acompanhamento deve ser feito com EUS ou ressonância em 6 e 12 meses. Carcinóides retais com mais de 2 cm dever ser tratados por cirurgia.

Não existem diretrizes para neuroendócrinos duodenais. Entretanto lesões pequenas (< 1 cm) podem ser removidas por EMR.

Tumor neuroendócrino de estômago

 

Pâncreas ectópicos quando localizados na grande curvatura de antro e com umbilicação central nem precisam de EUS para confirmação diagnóstica.

Lesões sugestivas de pâncreas ectópico

 

Tumores de células granulares podem ser diagnosticados com biópsias simples (S-100 positivo). Ressecção pode ser considerada para evitar a necessidade de vigilância.

Tumor de células granulares

 

Cistos de duplicação geralmente se apresentam com uma abaulamento na parede. Na eco podem ser anecóicos ou hipoecóicos (secundários a mucina produzida pelo cisto). Quando anecóicos, a punção deve ser evitada e na dúvida fazer antibióticos na lesões hipoecóicas mediastinais. Não existem dados que apóiam a vigilância nessas lesões e tratamento está indicado apenas se sintomas.

Lesão subepitelial da transição esôfago gástrica

Imagem ecoendoscópica compatível com cisto de duplicação

 

Metástases de melanoma e mama principalmente, podem se apresentar como lesões subepiteliais. São hipoecóicas e heterogêneas. A história clínica ajuda bastante nesse diagnóstico. Assim com a história de hipertensão portal levanta a probabilidade de varizes (estruturas anecóicas na eco).

 

Diagnóstico:

Para algumas lesões, como lipomas, cistos de duplicação e pâncreas ectópicos, aspectos endoscópicos e ecoendoscópicos são suficientes para o diagnóstico.

Lesões hipoecóicas e heterogêneas da submucosa e da muscular própria necessitam de análise tecidual para diagnóstico diferencial e para avaliação de potencial de malignidade. Imunohistoquímica é mandatória para caracterizar esses casos.

Biópsias simples raramente dão diagnóstico. Mesmo biópsias sobre biópsias tem baixa sensibilidade (30-40%).  Biópsias com pinça JUMBO, destelhamento (unroofing) e incisões com estiletes (single-incision needle-knife – SINK) tem um potencial diagnóstico maior, entretanto também estão associadas com risco de sangramento e podem causar fibrose que inviabiliza uma subsequente ressecção endoscópica se necessária.

Em relação a punção ecoguiada (FNA) não existem dados robustos ou diferenças estatísticas entre o calibre da agulha, usar ou não estilete, sucção ou técnica de leque (fanning)

 

Ressecções endoscópicas de lesões subepiteliais:

Mucosectomias com Cap ou com ligadura elástica podem ser realizadas para lesões pequenas (< 20 mm no estômago e < 10 mm no duodeno) e limitadas a mucosa ou sbmucosa.

ESD pode ser empregada para lesões maiores (até 5 cm) e até mesmo para lesões que acometem a muscular própria. Entretanto ESD é tecnicamente difícil, demorada e com risco não insignificante de complicações (perfuração, sangramento e disseminação tumoral, pela ruptura da cápsula)

A tunelização submucosa permite a enucleação da lesão utilizando os mesmos princípios da ESD, entretanto faz-se um túnel submucoso e depois que o tumor é completamente retirado, a incisão da mucosa é fechada. Quando se mantém a integridade da mucosa reduz-se o risco de peritonite e mediastinite. A aplicação dessa técnica, entretanto requer expertise e centros especializados.

Por último foi criada uma técnica de ressecção endoscópica completa da parede, necessitando assim de um fechamento confiável da parede, seja este procedimento com clipes convencionais, clipes over-the-scope, dispositivos de sutura ou endoloops. A efetividade deste fechamento permanece o maior desafio desta técnica.

 

 

Considerações finais:

Lembrando que lesões assintomáticas e benignas (lipomas, cistos, pâncreas ectópico e leiomiomas) não necessitam qualquer intervenção ou seguimento.  Lesões potencialmente malignas podem ser ressecadas por via endoscópica ou cirúrgica dependendo da preferência do paciente, características da lesão (tipo, tamanho e localização) e expertise do centro. E que a ressecção laparoscópica continua sendo a técnica de escolha para lesões sabidamente malignas.

Referência

Gastrointest Endosc. 2017 Jun;85(6):1117-1132. doi: 10.1016/j.gie.2017.02.022. Epub 2017 Apr 3. The role of endoscopy in subepithelial lesions of the GI tract.

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Pós Doutorado pela USP
Doutor em Gastroenterologia pela UNIFESP.
Médico assistente do ICESP.
Médico endoscopista do Grupo Fleury
Emerging Star pela WEO


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