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Alergia a Contraste em CPRE

por Bruno Martins
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contraste

Contrastes iodados são fundamentais para uma boa qualidade de imagem na CPRE. No entanto, é muito comum recebermos pacientes com antecedente de reação alérgica a contraste iodado em procedimentos radiológicos (ex: tomografia computadorizada). Por outro lado, a ocorrência de reação alérgica em pacientes submetidos a CPRE é extremamente rara.

Qual o risco de reação alérgica ao contraste iodado na CPRE?

O que fazer em casos de antecedente de reação alérgica?

 

Vários estudos já confirmaram que ocorre absorção sistêmica de contraste após a CPRE. A concentração sérica de iodo após CPRE pode aumentar até 90 x, o que  corresponde a cerca de 1% da elevação observada com administração endovenosa em procedimentos radiológicos e cerca de 0.6% da observada durante uma coronariografia.

 

Felizmente, a ocorrência de reação adversa em CPRE é extremamente rara:

  • Bilbao et al reportaram 3 reações adversas manifestadas como eritema e rash, em 8.681 CPREs;
  • Sable et al não encontraram manifestações alérgicas pós CPRE, apesar de antecedente de hipersensibilidade intravascular em 2 pacientes;
  • Draganov e col realizaram estudo prospectivo envolvendo 601 pacientes submetidos a CPRE com contraste hiperosmolar. Destes, 80 tinham antecedente de reação alérgica (39 leve, 21 moderada e 20 grave). Nenhum paciente recebeu profilaxia e não houve relato de manifestações alérgicas em nenhum destes pacientes.

 

A pancreatografia parece estar associada a maior absorção sistêmica de iodo do que a colangiografia.

 

Tipos de Contraste

Contrastes iodados são ácidos benzoicos hidrofílicos, com baixa afinidade por proteínas e baixa solubilidade aos lipídeos.

Podem ser divididos em iônicos (geralmente são de alta osmolaridade) e não iônicos (baixa osmolaridade)

  • Alta osmolaridade: custo menor
  • Baixa osmolaridade: menor chance de reações adversas.
  • Qualidade de imagem: semelhante

 

A qualidade de imagem dos meios iônicos e não iônicos são muito semelhantes. A diluição do agente com água diminui sua atenuação. Em geral, prefere-se o contraste um pouco diluído para o diagnóstico de cálculos em colédoco dilatado. Para estudo de estenoses e do pâncreas, preferimos utilizar contraste puro.

 

meios contraste

Obs: o Gadolíneo é um agente não iodado usado em radiologia para casos com antecedente de reações graves ao agentes iodados. Seu uso já foi descrito em colangiografia. No entanto, o custo é mais elevado, a apresentação do frasco é de 15-20 ml e a atenuação é menor do que os contrastes iodados.

Reações Alérgicas

Muito do que se sabemos sobre reações alérgicas a contraste são conhecimentos dos estudos de radiologia.

A incidência de reações adversas com contraste hiperosmolar é de 5-12%, com os de baixa osmolaridade 1-3% e com gadolínio é de 0.07-2.4%.

 

Existem 2 tipos principais de reações adversas:

  1. Anafilactoide (idiossincráticas)

  • São as verdadeiras alergias. Não dependem nem da dose, nem da velocidade de infusão.
  • Maioria ocorre dentro de 5 minutos da administração.
  • Patogênese pouco compreendida. Acredita-se que não seja mediada por IgE (como as verdadeiras reações anafiláticas) .
  • Mecanismo mais importante envolve liberação de histamina de basófilos e eosinófilos
  • Liberação de compostos vasoativos provocando hipotensão
  • Administração prévia de corticoides e anti-histamínicos pode diminuir sua incidência, porém uma pequena fração dos pacientes pode ter uma verdadeira anafilaxia mediada por IgE
  • Sintomas incluem urticária, prurido, edema cutâneo, coceira na garganta, congestão nasal, podendo em casos graves evoluir para edema de laringe, broncoespasmo e choque anafilático (ver tabela)

 

2. Não anafilactoide (quimiotóxica)

  • Também chamadas de reações fisiológicas, são causadas pela propriedades químicas dos meios de contraste e são dependentes da dose e da velocidade de infusão.
  • As características iônicas dos meios de contraste provocam alterações de sinalização neuronal e cardíaca, ao passo que sua osmolaridade interfere no balanço de fluidos.
  • Sintomas incluem: náusea, cefaleia, flush, hipertensão, tontura, calafrio, ansiedade, alterações no gosto (altered taste), sintomas vago-vagais e nefrotoxicidade.
  • Casos graves podem cursar com arritmia, convulsão e emergência hipertensiva.
  • Geralmente são autolimitadas e não necessita tratamento específico. Tampouco são preveníveis com administração de esteroides.
  • Visto ser dose-dependente e visto a absorção sistêmica pós-CPRE ser muito baixa, não deve ser uma preocupação nos pacientes submetidos a CPRE.

 

Quanto a gravidade, podem ser classificadas em:

  1. Leve: autolimitada, sem progressão
  2. Moderada: mais difusas e geralmente necessitam intervenção medicamentosa
  3. Intensa: risco de morte

 

 

Reação leve Reação moderada Reação intensa
Urticaria/prurido limitado

Edema cutâneo limitado

Garganta “arranhando”

Congestão nasal

Espirro

Urticaria difusa

Eritema difuso sem hipotensão.

Edema facial sem dificuldade respiratória

Sensação de aperto na garganta, mas sem dificuldade respiratória

Broncoespasmo com leve dispneia

Edema difuso ou edema facial

Eritema difuso com hipotensão

Edema de laringe com estridor e/ou hipóxia

Broncoespasmo com hipóxia

Choque anafilático

Prevenção:

A administração profilática de corticoides e anti-histamínicos tem se mostrado eficaz na redução das manifestações alérgicas aos meios de contraste. No entanto, o efeito destes medicamentos se administrados em menos de 4-6h antes do procedimento é insignificante.

Esquema mais utilizado entre os radiologistas é a seguinte associação:

Prednisona: 50 mg VO 13h, 7h e 1h antes da injeção de contraste

+

Difenidramina: 50 mg VO, EV ou IM 1 h antes

 

Recomendações da ASGE

As evidências de segurança provenientes dos estudos do uso endovascular na radiologia não podem ser extrapolados para a endoscopia, visto a baixa incidência de reações adversas, especialmente de reações graves na CPRE.

Não há evidência na literatura para recomendar contrastes não iônicos como método de prevenção de complicações em CPRE (existe evidência para o uso EV, mas não existe esta comprovação para colangiografia).

Em pacientes considerads de alto risco (reação anafilactoide grave com contraste EV) pré-medicações ou substituição do meio de contraste podem ser considerados uma opção, baseado em considerações teóricas.

 

Você já teve algum problema com reação alérgica em CPRE? Qual agente de contraste tem utilizado no seu serviço? Como conduz os casos com antecedente de reação alérgica a contraste?


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Referências:

1: Rose TA Jr, Choi JW. Intravenous Imaging Contrast Media Complications: The Basics That Every Clinician Needs to Know. Am J Med. 2015 Sep;128(9):943-9.

2: Pan JJ, Draganov PV. Adverse reactions to iodinated contrast media administered at the time of endoscopic retrograde cholangiopancreatography (ERCP). Inflamm Allergy Drug Targets. 2009 Mar;8(1):17-20.

3: Mishkin D, Carpenter S, Croffie J, Chuttani R, DiSario J, Hussain N, Liu J, Somogyi L, Tierney W, Petersen BT; Technology Assessment Committee, American Society for Gastrointestinal Endoscopy.. ASGE Technology Status Evaluation Report: radiographic contrast media used in ERCP. Gastrointest Endosc. 2005 Oct;62(4):480-4.

4: Bilbao MK, Dotter CT, Lee TG, Katon RM. Complications of endoscopic retrograde cholangiopancreatography (ERCP). A study of 10,000 cases. Gastroenterology. 1976 Mar;70(3):314-20.

5: Sable RA, Rosenthal WS, Siegel J, Ho R, Jankowski RH. Absorption of contrast medium during ERCP. Dig Dis Sci. 1983 Sep;28(9):801-6.

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Professor Livre-Docente pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo
Médico Endoscopista do Instituto do Câncer do Estado de São Paulo (ICESP)
Médico Endoscopista do Hospital Alemão Oswaldo Cruz
Emerging Star pela WEO


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2 Comentários

Everson Luiz de Almeida Artifon 01/04/2017 - 1:16 am

Bruno,
Esta materia deveria ser de domínio de todos os Endoscopistas Biliopancreaticos (CPRE).
Faço um lembrete de que o trigger da reação alérgica eh a injeção no dueto pancreático e muito menor na Via biliar. Então , em pacientes com síndrome alérgica , sempre evitar injeção no DP de modo absoluto.

Bruno Martins 02/04/2017 - 7:47 pm

Perfeito Everson, bem colocado. Obrigado pelo comentário! Abs!

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