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Linfoma MALT gástrico não associado a infecção pelo Helicobacter Pylori

por Felipe Paludo Salles
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Os linfomas gástricos são neoplasias raras e que correspondem a apenas 5% das neoplasias que acometem o estômago. Cerca de 50% dos casos são linfomas da zona marginal dos folículos linfóides (MALT) sendo que estes estão associados com a infecção pelo Helicobacter Pylori em mais de 90% dos casos. Os outros linfomas gástricos geralmente são do tipo difuso de grandes células B ou mais raramente o linfoma de Burkit ou do manto, que costumam ter uma pior evolução.

 

CASO CLÍNICO

Paciente do sexo feminino, 65 anos, com quadro de dispepsia, submetida a endoscopia digestiva que revelou lesão elevada em corpo distal.

MALT 4

Estudo histológico com diagnóstico de infiltrado linfoplasmocitário atípico sugerindo nova amostra de maior tamanho para diferenciação com linfoma. Pesquisa para Helicobacter Pylori foi negativa tanto no estudo histológico quanto ao teste da urease.

Realizada nova endoscopia para macrobiópsia de um segmento da lesão com uso de alça diatérminca monofilamentar.

MALT 5

Laudo histológico compatível com linfoma MALT sugerindo estudo imunohistoquímico para afastar linfoma de grande células B.  Pesquisa de H. Pylori negativa tanto no estudo histológico quanto ao teste da urease.

MALT 6

Imunohistoquímica compatível com linfoma do tipo MALT de baixo grau.

 

Estadiamento 

Estadiamento da lesão com tomografia e ecoendoscopia demostrando lesão restrita a mucosa sendo assim classificada como Lugano I (restrito ao órgão e sem linfonodos).

eco do malt

  • Teste Respiratório para pesquisa de Helicobacter Pylori negativo.
  • Sorologia para H. Pylori por Elisa IgM e IgG negativos.

 

Tratamento

  • Paciente foi tratada com esquema tríplice para H. Pylori por 14 dias com amoxicilina , clatritromicina e inibidor de bomba de prótons.
  • Encaminhada a hematologia para complementação diagnóstica e terapêutica tendo sido realizadas sessões de radioterapia.

 

DISCUSSÃO
A grande maioria dos Linfomas gástricos de baixo grau (MALT) estão relacionados com a infecção pelo H. Pylori e a erradicação do mesmo, como terapia isolada, leva a regressão e resposta sustentada em cerca de 80% dos casos. Porém cerca de 5-10% dos linfomas MALT não estão associados a infecção pelo H.Pylori e os protocolos de tratamento destes casos são controversos devido a raridade do caso para que se tenham estudos com número significativo de pacientes.

Estudos recentes mostram que mesmo nos casos não associados a infecção pelo H.Pylori o tratamento com esquema tríplice leva a resposta em cerca de 30% dos casos. A explicação para isto não está clara e atribui-se a alguns fatores como provável falso negativos nos testes tendo em vista que nenhum método tem 100% de acurácia, a participação de outras bactérias ainda não descobertas na patogênese desta neoplasia, e um eventual efeito imunomodulatório dos antibióticos, principalmente a claritromicina, poderiam agir para a cura da neoplasia.

Além disto sugere-se que nestes casos de MALT não associado ao H.Pylori outras terapias complementares devem ser realizadas sendo a radioterapia local a mais estudada e com melhores resultados até o momento.

 

Bibliografia
Naoki Asabi, et al. Eradication therapy is effective for Helicobacter pylori-negative gastric mucosa-associated lymphoid tissue lymphoma. Tohoku J. Exp. Med., 2012, 228,223-227

J. P. Gisbert, X. Calvet. Review article: common misconceptions in the management of Helicobacter pylori-associated gastric MALT-lymphoma. Aliment PharmacolTher 2011; 34: 1047–1062

Hyung Soon Park, Yu Jin Kim, Woo Ick Yang, Chang Ok Suh, Yong Chan Lee. Treatment outcome of localized Helicobacter pylori – negative low-grade gastric MALT lymphoma.World J Gastroenterol2010 May 7; 16(17): 2158-2162

M Raderer, B Streubel, S Wo¨hrer, M Ha¨fner, AChott. Successful antibiotic treatment of Helicobacter pylori negative gastric mucosa associated lymphoid tissue lymphomas. Gut 2006;55:616–618. doi: 10.1136/gut.2005.083022

S Nakamura, T Matsumoto, S Nakamura, Y Jo, K Fujisawa, H Suekane, T Yao, M Tsuneyoshi, M Iida. Chromosomal translocation t(11;18)(q21;q21) in gastrointestinal mucosa associated lymphoid tissue lymphoma. J ClinPathol2003;56:36–42

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Residência em Endoscopia Digestiva no Hospital das Clínicas da USP (HCFMUSP)
Residência em Gastroenterologia no Hospital Universitário da UFSC
Presidente da SOBED / SC na gestão 2018-2020
Médico da clínica Endogastro em Florianópolis e ProGastro em Joinville


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5 Comentários

Lívia Arraes 28/07/2015 - 4:59 pm

Excelente caso, Felipe. Parabéns!

Felipe Paludo Salles 23/07/2015 - 5:09 pm

Quando existe acomentimento linfonodal perigástrico (Estadiamento IIa) a possibilidade de cura apenas com antibioticoterapia inexiste e protocolos de quimio e radioterapia devem ser instituídos. Porém quando os linfonodos não estão acometidos (Estadiamento I) pode-se tentar o tratamento apenas com antibióticos mas sabendo que se houver o acometimento da submucosa a chance de cura cai para 45% e se acometer a muscular própria para menos de 25%. Nos casos de não resposta aos antibióticos (negativação do H.Pylori e a não diminição de 50% da massa tumoral 4-8 semanas após tratamento)mesmo nos casos restritos a mucosa, os pacientes devem ser encaminhados para hematologia para complementação terapêutica com quimio e/ou radioterapia.

Ingrid 23/07/2015 - 3:15 pm

Dr Felipe, o que mudaria no tratamento casa tivesse atingido a submucosa?

Felipe Paludo Salles 23/07/2015 - 1:07 pm

Olá Sergio, obrigado pela participação no site. Este é um caso que custei muito a acreditar que era H.Pylori negativo. Ter um exame com resultado falso-negativo em uma única endoscopia não é raro mas na segunda endoscopia fiz inúmeras biópsias de corpo e antro que foram submetidas a estudo histológico e ao teste da urease sendo tudo negativo. Temos teste respiratório para H. pylori em nosso serviço e realizei duas vezes sendo ambos negativos. Não satisfeito realizei Elisa que demonstrou IgG negativo, mostrando que realmente a paciente jamais entrou em contato com a bactéria. Fiz uma extensa revisão do caso e discuti o mesmo com um professor em SP que considero a maior sumidade sobre o tema no Brasil. Me orientou tratar de qualquer forma por 14 dias, me enviando artigos sobre isto, e encaminhar para avaliação com a hematologia. Esta paciente foi submetida a biópsia de medula óssea e a 6 sessões de radioterapia há 3 anos atrás. Desde então acompanho ela semestralmente e a lesão praticamente desapareceu, só existe um pequena cicatriz devido a macrobiópsia que fiz no local. O mais importante neste caso é passar a mensagem de que MALT é um linfoma, uma doença séria e que deve ser investigada da mesma forma. Mesmo nos casos que estão associados com a infecção pelo H.pylori, se o acometimento da lesão atingir a submucosa a chance de cura apenas com uso de antibióticos cai significativamente. Por isto a avaliação com ecoendoscopia é mandatória em todos os casos de Malt e se houver acometimento da submucosa o tratamento deve ser multidisciplinar envolvendo a hematologia. Grande abraço.

sergio merlim 23/07/2015 - 9:29 am

dr. felipe….. caso interessante e apesar de realmente não vermos com frequencia é importante revisar o assunto… em 20 mil endoscopias, devo ter visto uns 4 sendo deles todos relacionados ao H. pylori…. tratou resolveu…..grande abraço…

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